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Por que é tão importante para si ocupar espaços?
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Acessar os espaços (de fala) pode ser uma realização pessoal decorrente de privilégios estruturais, ocupá-los e ressignificá-los é uma conquista coletiva. Não existe empoderamento individual, nem linguagem de uma pessoa só.
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Dois extremos coexistem na música eletrônica brazyleira: o do entretenimento de massas que abocanha desde o gospel e sertanejo ao funk, hip hop, R&B, EDM e tudo mais que rolar no grande gênero da música POP; e o da arte independente.
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Esse amplo setor é protagonizado por mulheres, pretes e LGBTQIA+ de todas as regiões do Brazyl, articulades nos centros e periferias. A comunidade de música eletrônica independente é marginalizada, acessa y alimenta indiretamente o circuito de entretenimento na política da loteria. Ela é um nicho, que é visto com maus olhos pela população comum devido o som repetitivo, mas principalmente por ser frequentado por LGBTQIA+ e pretes, de ser associada ao uso de drogas.
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Esses corpes sem juízo encontram-se nas festas pela construção de um ambiente de liberdade, respeito e reconhecimento das narrativas individuais num contexto de bando.
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Estes corpes são as festas, as festas são Totem de manifestação da vida numa realidade cercada por Tabus. Todo encontro é risco, é a medida do improvável numa enorme e desigual cidade latinoamericana. Esses corpes tornam-se (r)existência como demarcação urbana dessa comunidade.
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O desenvolvimento predatório da cidade de São Paulo, ao longo de sua história, com um urbanismo rodoviarista, as demandas do mercado imobiliário por novos centros de exploração e moradia criaram enormes cicatrizes. A segunda maior cidade da américa latina convive com espaços ociosos entre viadutos e praças, áreas industriais abandonadas, centenas de milhares de edifícios parados por dívidas públicas e heranças de velhas oligarquias. Durante muitos anos assistimos esses espaços permanecerem fechados ou, quando ativados pelos movimentos de moradia, culturais e por trabalhadores, violentamente expulsos.
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Somos uma coletividade liderada por mulheres e LGBTQIA+ que alinha sua atuação aos movimentos de luta pela retomada dos espaços físicos e subjetivos de liberdade.
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Como se protege e à sua comunidade num contexto em que a política está a promover tanta violência? As suas actuações são também uma autodefesa?
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Respeito, afeto, trabalho, reconhecimento e dinheiro.
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Todos esses fatores passam por posturas individuais e coletivas.
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Ações como a entrada gratuita para pessoas trans e drags, água gratuita, composição da equipe de produção e de artístico são elementos essenciais para o estabelecimento de um território seguro para mulheres, pretes e LGBTQIA+ numa sociedade de morte e violência.
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A MAMBA é uma festa em constante transformação.
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Atingirmos uma equipe 95% composta por mulheres e LGBTQIA+ é uma construção de 7 anos que se expande para muito além da MAMBA. Desde 2013, muitas outras festas e coletividades surgiram: Batekoo, coletividade.Namibia, Bandida, Marsha!, Vampire Haus, Blum, Sangra Muta, Metanol, Caldo, Dusk, Houve of Divas, Dando*, Vorlat, Chernobyl, Masterplano e muitas mais.
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Isso representa um pouco do que significa esse movimento independente, também no sentido de profissionalização de uma geração que está articulando um circuito alternativo ao mainstream.
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Isso é motivo de celebração.
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Nós celebramos juntes e queremos o reconhecimento em vida.
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Porquê conceber o seu acto performativo como experiências imersivas, criando uma espécie de mundos paralelos que estão na realidade?
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A MAMBA é uma espécie de respiro para a cidade e para as pessoas que não se enquadram na estrutura normativa da sociedade.
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O encontro é o fator improvável, como dissemos.
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Ao mesmo tempo, é nossa melhor chance de existir como corpes.
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Isso se aplica à nossa linguagem.
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Música, performance, design gráfico, poesia, vídeo, espaço, luz, instalação, ocupação dos espaços, elétrica, financeiro, redes sociais, segurança, todos esses elementos estão presentes em todas as nossas frentes de trabalho: festas, no selo MAMBAREC, na Rádio Vírusss, nos projetos de intervenção.
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É uma experiência envolvente, porque envolve muitos corpes.
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Queremos criar experiências que sejam gatilho do pensamento livre, da livre atuação y fruição dos corpes sem juízo na realidade Brazyleira y Latino Americana.
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Durante este tempo de bloqueio que práticas desenvolveu para se manter envolvido com as suas comunidades?
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Em maio, mantivemos a celebração do aniversário da MAMBA com o Festival Online de 7 Annnux. Foram 4 dias de transmissão ao vivo e pré-gravada com 61 atrações musicais e performativas, oficinas e debates.
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Esse, sem dúvida, foi nosso maior esforço coletivo, e já foi uma loucura.
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Como coletividade, participamos de alguns debates e festas online nacionais e internacionais.
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A Rádio Vírusss realizou a série de programas da Invasão Nordestina.
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Com a MAMBAREC, tivemos os lançamentos de "Tragicomic Remixes" (Valesuchi e V. A., álbum), o álbum "Pedra Preta Remixes" do TETO PRETO com dois videoclipes, o EP "Dois Leões" de Tantão e os Fita também com videoclipe e agora em dezembro, o Volume 1 da Coletânea Kengaral Eletrohits. Apesar dos lançamentos serem digitais, o selo produz merchandising para a nossa lojinha da festa.
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Paralelamente à isso, nosso time de produção ficou o ano todo redigindo projetos para editais públicos e procurando parcerias com capital privado para levantar recursos para continuar as atividades da coletividade. Através das parcerias e do autofinanciamento do festival, por exemplo, conseguimos organizar cachês para os artistes da festa e, posteriormente, um auxílio financeiro mensal para quase 25 artistes e profissionais da coletividade.
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Não é nem perto do que gostaríamos de fazer para, de fato, amparar a nossa rede da cena independente. Porém, a pandemia é um momento de arrumarmos a casa, nos dedicarmos à organização estratégica de todos os setores da MAMBA e construímos a fundação desse novo momento da coletividade.
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Com muito trabalho de criação, redação de projetos coletivos e estudo, estamos conseguindo levantar recursos para atuar com força total em 2021 em novos formatos, mas com a mesma essência incansável das cobras.
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Boas coisas estão por vir! Vamos começar o ano com a abertura de um pequeno espaço cultural no centro de São Paulo. O COVIL vai abrigar o co-worqueen das MAMBAs, onde ocorrerão as Rádio Vírusss, Oficinas, Debates, Cine Clubes e pequeniníssimos eventos.
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Um espaço de trabalho, um espaço de encontro e experimentação para escutar música, performar, criar, bebericar, petiscar e conversar. É uma garagem cercada por um jardim tropical inacreditável bem no centro de São Paulo.
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A MAMBA entende que é responsabilidade das festas independentes não compactuar com a política negacionista de Jair Bolsonaro e do capital especulativo assassino. Até hoje, trabalhamos com aglomerações como artistes e como coletividades. Estamos construindo um novo espaço de articulação segura para, quando pudermos voltar às tão aguardadas festonas, podermos chegar com força total nas fábricas desativadas e ruas.
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Criamos uma área de "perguntas frequentemente respondidas" no nosso website. Qual é a pergunta mais irritante que as pessoas lhe fazem e que viveria para evitar responder? Podemos colocá-la lá e eles simplesmente lêem-na.
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Como surgiu a MAMBA NEGRA?
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O governo Bolsonaro está sendo muito ruim para a cultura e para a comunidade de mulheres e LGBTQ?
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Como é para vocês, enquanto mulheres, atuar numa cena tão dominada por homens? Vocês já sofreram abusos e situações desagradáveis? Como foi?
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Como é ser músico latino americano?
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O que você acha que poderia mudar?